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Thiane Ávila

Autor: Thiane Ávila

Amor principiado

22/5/2017 - Votorantim - SP

A enunciação funciona como uma espécie de manual que precisamos escutar, que necessitamos levar no bolso para não esquecer certas carícias do próprio espírito. Cuidados há tanto latentes. Mas o propósito, por vezes, se desfaz à medida que, na escuridão do quarto, lembro as palavras calejadas de quem divide comigo suas experiências, sempre na esperança de que não se perca o brilho da dor. A compostura terrena da necessidade de se envolver.

Embora haja inúmeras teorias e vertentes sobre o amor, quase academizado frente a tantos discursos que emitem regras e acordos contratuais sobre como fazer direito, ainda não adquiri a capacidade de calar os berros que soam de dentro. São mal-educadas as sensações que não couberam na caixa envergada dos limites que impus aos meus sentimentos, reservando aos amores próximos os aprendizados dos amores que já se foram. Não me fecho, mas sinto que não me abro. Não me calo, mas sinto que nem tudo falo. Ao sair da posição de comando, viramos reféns desse masoquismo que é amar. Desse exercício que sabemos que nunca acaba bem, pois o início é selado exatamente pela demagogia de não terminar.

Nessa loucura de não saber parar, mas de não querer continuar, colocamos a mente na segmentação indumentária dos padrões e das conveniências, estereotipando a leveza. Colocando celas no que está bem. A realidade é que os nomes dados corrompem. Os rótulos atingem apenas o psicológico que, de tão fortes, enfraquecem a força que o descompromisso por vezes carrega. O problema é que não colocamos fé no que não tem nome, comprovando o quão cultural é o amor. O quanto de prazer sentimos em tornar a brandura peso e a calejar o conforto.

Quero, pois, apenas o colo seguro e as mãos macias percorrendo meu corpo. A voz que vibra em meus ouvidos e o frio na barriga a cada novo encontro. Sem roteiro, sem métrica. Sem antídoto e sem cura. Um amor que não se cure e que não adoeça pela tentativa de eternizar. Quero menos nomes e mais sensações. Menos contratos e mais acasos pelo prazer. Mais prazer pelos desacasos. Pelos neologismos e pelas desinvenções; afinal de contas, o amor principiado é aquele que, inconsciente, se constrói despercebido.

 

THIANE ÁVILA.

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