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Thiane Ávila

Autor: Thiane Ávila

Desnaturalizar

4/3/2016 - Votorantim - SP

Por entre os conformismos a que me submeto todos os dias, vez que outra encontro brechas de abstração corrompidas. Medos isolados, confundidos com certezas banais sobre coisas que sequer existem ou têm chance de existir. Minha derrocada subjuga a ousadia de querer quando enfraqueço meus próprios questionamentos. Quando minha insegurança ultrapassa a fronteira que alimenta o limbo entre o ócio e o exercício de simplesmente querer. 

Sempre que enobreço os defeitos, tendo a olhar com os mesmos olhos a desconstrução em potencial. O desafio não está em encontrar exemplos que comprovem minhas teorias, mas novas assimilações que falsifiquem lembranças. A ontologia dos elementos que me compõem é a abstração de minhas especificidades. Somos todos matéria de estudo construídas para a desestrutura. A violência do confronto enriquece e não o contrário.

Não me serve a afirmação da bondade quando o resultado de uma intenção é visto tão somente no efeito que ela produz. De boas intenções o inferno está cheio. Nego o absolutismo de verdades que contradizem meus desejos e ânsias. Poderia ser a hipocrisia de uma vingança acariciada no ventre do inimigo, mas prefiro o tapa dolorido do descontento que intriga a verdade inventada. Que coloca à prova qualquer manifestação de lisura e desverdade. Meus neologismos asseguram um quê de desconvenção naquilo que comunico. Não sou transmissão ou acordo, mas um espaço e momento. Circunstância e conveniência. Todos podemos ser lidos através de lentes culturalmente expostas, mas jamais decifrados.

Meu vocabulário fático demonstra a persistência nas averiguações atrasadas sobre o feito. Aquilo que me reduz à diferença desimportante e inacabada frente aos demais. Nossa atual tendência é a de comunicar apenas para manter relação. Cada vez menos há informação no dito. Talvez a crescente carência do despropósito. Ou então a procura incessante por nadas que contemplem uma curiosidade vazia. Qualquer uma das partes converge em adestrações simbólicas e de convivência. Queria eu ser mais que isso.

Na arbitrariedade do que dizemos, perdemos a liberdade a partir do momento em que nos sujeitamos às adequações. Meu egocentrismo perpassa pelo sonho de constituir lonjuras indomesticáveis. Criaturas soberanas sobre a entrada de uma pobre criança às convenções enjauladas e restritivas. Gosto de desnaturalizar o potencial eminente, carregando na mala o vácuo das manifestações das certezas vomitadas no culto da existência. Tudo obra das mesmas vontades deixadas de lado. Ouvimos mais a civilidade do que o próprio corpo. Ou você vai me dizer que nega a maior fatia de bolo com satisfação?

Por só ter a capacidade de reconhecer aquilo que conheço, sinto-me limitada ao acaso. Quero ser descontruída e desnaturalizada. Levada aos pensamentos mais absurdos e às crenças mais catastróficas sobre um universo desconhecido. De uns tempos pra cá, pensar que o real é o que vivo parece-me insuportável. Conceituar qualquer coisa que não seja empoderada de surrealidade equivale a demonstrar com palavras a imensidão dos sentimentos que compõem um ser.

Ser limitado talvez estabeleça uma ponte real com os sonhos tangíveis. A simultaneidade prevista no ato relacional me parece pequena frente às possibilidades da convivência. Sozinha ou acompanhada. Em silêncio ou em discurso. A verdade é, pois, o máximo que se sabe sobre alguma coisa em determinado momento. Assim, não cabe a uma vida a produção de generalizações, mas a busca por especificidades. Estou fortemente encarregada por minha vivência – sem o sobre de antes.

 

THIANE ÁVILA.

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