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Thiane Ávila

Autor: Thiane Ávila

Quebra-cabeça

14/11/2015 - Votorantim - SP

Cada vez que inicio um texto é como se estivesse apenas encaixando as peças de uma vida que ainda não se tornou real. É como se as palavras fossem joguetes desconexos de uma história que ainda não faz sentido, mas que está à espreita da reconstrução.

A cada desencontro que os dias provocam, sinto-me coagida pela vontade de ficar. Assemelha-se a uma vontade de reconstruir, em matéria real, o que já fez sentido na mente há muito tempo. É a armadilha da vontade que conflui com a expectativa de tornar-se real, sem garantias e pretextos. Sem explicações ou rodeios. Ser apenas por ser, e nada além disso.

As pessoas têm a terrível mania de questionar-se sobre tudo, explicando cada vírgula com as certezas adquiridas sabe-se lá como. Perde-se a ganância pela dúvida, aquela que faz buscar o fim do quebra-cabeça. A (re)montagem de uma vida sincronizada apenas na imaginação.

Talvez o amor funcione assim e, por isso, seja absolutamente tentador. Quem sofre de amor sofre de TOC, bipolaridade, depressão e excesso de dopamina. Constantemente drogado pela insolação das incertezas, sem saber quando é pra valer e quando é mera especulação de quem está do outro lado. Eu sei, e como sei, o quanto dói ser especulado.

Não aprendi a conformar-me com certas coisas, mas já identifiquei as que valem a pena serem postas à discussão na mesa de bar. Aquelas que valem a cerveja tomada durante os argumentos. Aquelas que dão sentido ao tumulto vazio dos momentos que se costumam viver na maior parte do tempo.

Reconstruir fatos nem sempre é voltar a vivê-los diferente. Há, pois, reconstruções nunca antes construídas. O fato é que o sentimento, a ideia e a vontade precedem o concreto, e sua mudança implica a refeitura do real. Ninguém pode dizer que sonhar não faz parte do mundo físico. É pouco dizer que a vida acontece apenas nesse plano.

Como num quebra-cabeça, o desafio de encontrar a peça certa é uma constante da rotina. Não tenho paciência para jogos muito demorados, mas gosto de experimentar seus erros e despadrões. A peça errada no lugar certo. No fim, sei que não terei meu quebra-cabeça montado, e isso nem me interessa. O que me frustraria, ao contrário, seria não ter o máximo de peças a minha disposição para testar e errar. A realidade não é uma jogada pronta, mas uma vontade de fazer pelo prazer de ver o que acontece.

 

THIANE ÁVILA.

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