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Thiane Ávila

Autor: Thiane Ávila

Quem mudou afinal?

25/8/2015 - Votorantim - SP

O que fizeram com os baluartes da resignação frente aos paradigmas que se fazem indispensáveis ao bom andamento dos dias? À mantença da ordem e do deleite ideal que percorrem a rotina. Talvez já não se tenha mais certeza se somos nós quem passamos pelo tempo ou se é o tempo quem passa pela gente.

Em uma escala desconexa, feita para medir a porcentagem da compaixão e do respeito, construíram-se, ao mesmo tempo, as graças da desonra. O almanaque com forte patrocínio publicitário, constituído de noções que aprenderam a dizer somente alguns sins.

O princípio da incerteza da realidade é uma brecha tanto no realismo como no impossível. Somos, pois, a unidade na diversidade. O coro no silêncio dos desafortunados. Tudo saco da mesma areia. Sem capacidade de redimensionamento, sem possibilidade de enquadramento ou foco. Fruto de uma lente objetiva ansiada pela humanidade, de modo a ser programada para ter o diafragma fixo. A negação da abertura à vinda de luz. Ou então ao fechamento que direciona o foco profundo. Sendo, enfim, o não à participação de um em detrimento do outro.

O mundo inteiro deveria abismar-se com a quantidade de respostas que necessita dar a tudo. Assusta-me o amor para alguns, a hipocrisia ou a ingenuidade de acreditar que a lei é feita para todo mundo em nome de todo mundo, já que é mais prudente reconhecer que ela é feita para alguns e se aplica a outros.

Não há nada mais conservador que a utopia, porque ela não permite redimensionar as perspectivas. É utópico crer que ela seja a chave da cura dos desfeitos. A mesma utopia que sonha com a ternura para com os avessos é a que camufla a esperança pela volta às tradições. Pela honra e decência reestabelecidas.

Penso, mas não consigo chegar a um consenso sobre quem mudou afinal. O espaço que nos comporta é decorado com nova aura. O tempo que contabiliza nossos feitos é uma sugestão de repasse, de transmutação. O ponto de vista, pois, passa a ser considerado juiz legítimo de qualquer inferência. Castigador em potencial das desadequações.

Não nasci, por fim, para justificar-me ou sentar em uma mesa de família para despojar-me sobre meus feitos. Para explicar minhas alternâncias. Para tentar tornar legível o que não foi feito para ser lido. Qualquer tentativa de definição será falha, já que o rascunho me comporta. Minha biografia é uma outorga ilegítima escrita à lápis e apoiada em matiz de nuvem.

Sou, por vezes, a negação do fortuito e o conforto do lar. A aventura romanceada e o imundo obscuro. O orgulho e a desgraça. A desonra e o tédio pelo pertencimento. Um dia entenderemos que o amor é garantia de nada justamente porque contém tudo. É o transbordamento do vazio que reitera os fracos de certezas. Os desnutridos de padrão. 

Minha teimosia é uma resposta a meu ser desconsertado com a resistência de uma sociedade empedrada e irônica. O problema das pessoas não é crescer, mas esquecer o essencial. A diferença que não diminui. O dividir pelo júbilo de ver o sorriso do outro gratuitamente. O pagamento com felicidade. O bônus do bem-estar e da paz. 

Aos que indagam minha condição em todos os âmbitos de vida, respondo que não há importância maior do que fazer quem amo feliz. A guerra instituída pelo amor é a piada do milênio. É a vontade estarrecida de pedir para descer, de fato, do mundo, acreditando em uma dimensão subdesenvolvida, já que o conceito de desenvolvimento não se encaixa no meu padrão irregular de levar os dias.

 

THIANE ÁVILA.

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