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Thiane Ávila

Autor: Thiane Ávila

A coisa que mata e dá prazer

4/3/2015 - Votorantim - SP

Bucólicos anônimos caçoam da existência extemporânea das falas enjambradas dos oratórios virais. Criações terapêuticas de soluções arrítmicas para existências pacíficas e de overdose sepulcral. É o romance dos anos oitenta que ainda soa nos ouvidos. 

Viver na dosagem que dá vida para não morrer de prazer daquilo que garante a permanência. Caótico paradoxo do veneno que serve de alimento. Que mata e faz viver. Que abomina e faz crescer. Drogas de efeitos colaterais para a felicidade e a tristeza mútuas.

Perca-se o sex and drugs na eloquência salsável contemporânea. De esporádica audiência. De hipocrisia hipocondríaca e sorumbática. De soar os tambores da falta de humor.

Todos os dias mortos acordados buscam o sentido de permanecer. A inédita história escrita no peculiar e majestoso livro da vida é a mesma. Roteiro secular e cadenciado. Propício a desrumores de fanfarrões donos das línguas. Eruditos de demência heroica.

Em uma relação de puro prazer com as palavras, escorreu sobre os escombros da intimidade qualquer míngua de veneno suficiente para liquidar a benfeitora. Qualquer destoar. Mísero erro de toque. Barreira suavemente transpassada. Sacanagem consensual e ainda assim julgada, sentenciada e condenada. A vida descontente com o prazer, que é vizinho arruaceiro e íntimo da liberdade subjugante.

A profanação honesta deliberou um direito inédito: de agir a existência. Terás consequências sobre tuas escolhas. É, pois, o que se procura. A culpa pelo crime. O crime pela culpa. A sentença libertadora que permita uma tiragem mínima das ledices que usurpam e dão tesura. Um claustro bem ornamentado de pedras maliciosas e frívolas. 

Trata-se de um olhar e nada mais. Um aprofundamento discreto e excitante. Um dedilhar de violão sobre as possibilidades melódicas da composição. Com excesso para valer por ser necessário ao contento. Sentir os limites da provação. A dose elevada e fatal do que faz viver, estando sempre a um fio. Ecótono das sensações. Transe e neurose do inconsciente.

O que subsiste nos outonos e nas primaveras é, por maestria, uma obrigação delirante a um grito de transgredir as regras. De ultrapassar as barreiras do que é reconhecidamente bom. Do que é lucidamente convidativo à vida.

O verdadeiro convite à vida é entregue pela morte. Tem sua letra e perfume. Seus dizeres e entonações. A morte lúcida do prazer visto no túmulo. Do enterro precocemente despejado sobre as escolhas vis sob os olhos incrédulos. Sentenciosas sob a hipocrisia dos fortunados de depressão feliz.

Ora, já é o momento de dar boas-vindas aos defuntos inaugurados no século passado. Suas memórias perpassam os anos e, ainda assim, são concorrentes das rogatórias. Inimigas das vidas completas e saudáveis. 

Saudável perfeição de existir nada mais é do que uma rememoração egoísta de um laudo mal dado. Prioridade universal de caquéticos do prazer. Surdos de eloquência viril e de aprazimento letal. 

Sinto avisar, mas a vida é mortal, senhores. Só sairá são dessa aventura mortífera aquele que não tiver descoberto o prazer da desmedida. A vitalidade tumular do excesso.

 

THIANE ÁVILA.

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